quarta-feira, 9 de julho de 2014

A glória de chorar


“Olha lá, 
quem sempre quer vitória e perde
A glória de chorar”

"Sejamos um!", é preciso aprender isso em todos os contextos. Aprender a perder (taí a grandeza de um coração humano), e entender que a gente não tava mesmo merecendo ganhar aquele jogo. Ou mesmo essa copa. E que ainda precisamos nos esforçar muito pra ganhar na educação, na saúde, na segurança pública... O Brasil sou eu, é você, somos cada um de nós. Vamos usar nosso riso fácil pra levantar a cabeça no campo, e na vida. E chorar também pelas nossas perdas diárias pra corrupção, pra desigualdade, pro "jeitinho" usado da forma mais cruel possível. Ainda podemos mudar esse jogo. A bola  é nossa. É só ter samba, gingado, interesse, e votar com consciência. Esse jogo não é apenas do político corrupto, da polícia abusiva, não é do Brasil que tá fora. É do Brasil que tá dentro, é meu, é seu, é de todos nós. Não tô dizendo que é simples, não tem como pensar assim. Mas se conseguimos ser unânimes, unidos, orgulhosos,  quando nossa seleção entra em campo, sei que podemos fazer o mesmo pra torcer pelo nosso país, pelo nosso futuro.  
Gente, perder faz parte do jogo. Perder de goleada é um risco. Não somos os melhores sempre, ninguém é. E não temos sido os melhores com a gente mesmo. Talvez, quando pararmos de roubar (sonegar, fugir, culpar terceiros pela nossa responsabilidade), quando deixarmos de ultrapassar pelo acostamento, quando respeitarmos as ciclovias, as vagas dos idosos, dos deficientes, quando os corruptos forem presos, quando as greves forem respeitadas e olhadas, quando os "Amarildos" forem encontrados, honrados,  quando deixarmos de imitar os americanos e lembrar que temos sim, uma cultura muito rica e incrível.  Quando encararmos a realidade de um engarrafamento sem xingar o mundo, quando assumirmos estar cercados de abuso de autoridade, de uma realidade violenta estampada na nossa cara todos os dias, quando encararmos nossos fantasmas, nossas faltas, nossas culpas... Talvez aí possamos ver a nossa força. E da força, virá a alegria de ser brasileiro “com muito orgulho, com muito amor”. 
Eu sou brasileira. Morro de amores por esse país. E acredito, desejo, que possamos ser humildes, amorosos, cuidadosos com o que é nosso. Ninguém pode arrancar a cultura e a história de um povo. Mas um povo precisa se reconhecer como UM. E acho que na hora de lutar pela melhora nossa de cada dia, pelos gols na política, a gente perde a força... (e não me excluo disso). Nos tornamos negativos, mesquinhos, e fazemos vista grossa, ou deixamos mesmo de enxergar, de nos importarmos. Ou, só xingamos mesmo, e "bola pra frente". Que o 7x1 de ontem fique pra sempre na nossa memória! Porque quando se perde, é que se ganha. "Quando sou fraco, então é que sou forte".  

Já temos muita fé, e um sorriso no rosto ainda que a vida seja dura. O que nos falta é envolvimento, entrosamento pra fazer um gol. Quando apoiarmos os pobres, brigarmos para que eles não sejam removidos de suas casas pra a construção de estádios (ou qualquer outra razão). Talvez quando entendermos que a luta do excluído é a nossa, que a derrota nas favelas que perde filhos amados em guerras de polícia e traficante, também é nossa. Cada vez que uma criança morre, o país inteiro devia ficar de luto. Como está hoje. Cada vez que um “Amarildo” some, que um Joaquim Barbosa é obrigado a desistir... 
Sempre que ficamos felizes pelos feriados, esquecemos que a realidade à nossa volta é de goleada... Só que é de gol contra.  Eu sou brasileira, e acredito. Na nossa força, no nosso gingado, no nosso riso contagiante, no nosso carisma, na nossa determinação. Acredito que somos um povo incrível e maravilhoso. E que precisamos parar de conversa mole, parar de tirar o corpo fora, de ligar na novela pra esquecer o sofrimento do jornal.  Quando encontrarmos a nossa força, a gente vai entender que somos o que somos, porque deixamos. Falo por mim. Não me adiantou em nada culpar o mundo pela realidade que me cerca. Eu faço parte dela. Mas ninguém faz gol sozinho. A seleção, na minha humilde opinião, não teve muito entrosamento. E por isso não foi pra frente. Não é culpa do Neymar, do Julio Cézar, do Felipão... não se entrosaram, e por isso jogaram um futebol pior que o da Alemanha. Simples assm. É o mesmo na nossa realidade social (obviamente sem entrar em detalhes mais profundos). Sei que o buraco é mais embaixo, sei que há quem lute e há quem fale e não se mexa. Muitas vezes, essa sou eu. Mas das maiores certezas, fico com essa: muito mais triste perder de goleada pra injustiça social, pra violência, pra corrupção, pro conformismo, do que no campo pra Alemanha. Como disse bonito uma amiga querida: “(...)A gente chora de tristeza e de alegria. A gente é capaz de ir abraçar o adversário perdedor no fim do jogo. A gente quer ser rico, mas não quer que exista pobre. A gente ama receber e servir o outro. A gente acha que o que é melhor pra gente é o melhor pro mundo, A gente se acha esperto quando desrespeita regras. A gente faz a melhor música do mundo, estando longe de ser a mais perfeita. A gente se corrompe facilmente. A gente tem o nosso “jeitinho” e, quando usado pro bem, não existe nada mais sensacional. A gente acredita. A gente mente. A gente não gosta de desagradar. Nossas mães (ou pais) fazem a melhor comida do mundo. A gente faz amizade de infância quando já é adulto. A gente fala alto. A gente conversa. A gente xinga e briga. A gente se diverte e deveríamos andar pelo mundo ensinando isso. A gente samba, na mão, na voz e no pé. Ninguém é só ruim. Ou só bom. A Alemanha vitoriosa de ontem há pouco mais de 2 décadas tinha um muro que dividia uma cidade ao meio. E joga futebol muito bem. E fabrica carros muito bem. Hoje, passeando pela internet, parece que o Brasil é só ruim. O que é mais triste ainda do que a lavada de ontem. Talvez, no dia em que aprendermos a valorizar o que temos de bom e melhorar o que temos de mau, uma vitória ou derrota no futebol não faça a menor diferença, pois continuaríamos orgulhosos. De sermos quem somos.” (Carol Alves - Gosto Imenso)

Brasil, sua alma verdejante, seu céu azul imenso, suas crianças risonhas, suas comidas, sua gente... Somos tão ricos! Só falta a gente perceber isso. E usar essa nossa riqueza tão única, pro contra-ataque. Afinal, gol de virada é muito mais gostoso!

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Sobre os encontros

Foto: Henri Cartier Bresson

Sempre tive um certo fascínio em relação a encontros. Não estou falando apenas de encontros românticos, mas toda sorte de encontros que vivenciamos por aí. Só por conta desse tal de exisitr.
Aquela pessoa, que você poderia nunca ter olhado, com quem poderia nunca ter falado, se tornou simplesmente sua melhor amiga. Como? Quando? E se o encontro não tivesse acontecido, como hoje seria você? Seria a mesma pessoa? Penso que não. Cada encontro nos perturba, comove, modifica. Geralmente pra melhor. Cada encontro é transformação, é nó. Nó que vira laço, pra ficar mais bonito.
Cada encontro gera como que uma terceira vida, aquela, que nasce depois do esbarrão.
Tem gente que nem precisa virar a melhor amiga, mas só de passar pela sua vida, deixa um tanto de amor. Geraldine, a senhora sorridente que, todos os dias, passava pelos enormes corredores do aeroporto de Ohio empurrando um carrinho de limpeza. Todo dia sorria, todo dia espalhava sua paz. A paz de Geraldine me alcançou pra nunca mais soltar. Ela me deu seus sorrisos, eu devolvi com abraços, presentinhos e orações. Depois de quatro meses convivendo com ela, voltei para o meu país, mas nunca mais esqueci seu rosto. Suas marcas profundas de um rosto quase idoso, mas ao mesmo tempo, traços suaves como de um desenho que começa numa folha em branco. Ela era só pureza. E mesmo não sabendo quase nada da sua vida, nem ela da minha, mesmo sendo apenas sorrisos, “good mornings” e jornais divididos, a guardo comigo. Gostaria de ter alguma fotografia dela, mas nem isso. Ainda assim, o tempo não pode jamais levar Geraldine de mim. Não preciso vê-la, pois a guardei aqui. Dentro.

Sempre tive um certo fascínio por esse tal de encontro. O encontro aparentemente tão banal, que é no fundo,  extraordinário. 

sábado, 2 de novembro de 2013

Menos é mais





Quero um pouco mais.
Mais tempo, mais silêncio, mais encontros.
Mais olho no olho, menos mensagens a responder, menos "likes", "tweets" e "posts".
Quero mais livros. E menos distrações.
Mais verdade, menos superficialidade.
Quero mais risada, mais nascimento: de sorrisos, alegrias, sonhos.
Menos vídeos, menos "você não viu?!" (não, não vi).
Menos correria.
Quero pedalar sentindo a ventania.
Ver os bichos, ouvir os pássaros, contemplar o pôr do sol (e compartilhar apenas com quem estiver ao meu lado).  
Quero um pouco mais de agora. De intenso, de inteiro. 
Quero meus dias sem-tempo.

Não sou avessa à tecnologia. E me adaptei a ela quase que perfeitamente. Quase.
Porque tem dias, que a quero longe.
Quando preciso de mais sentimento. Ficar mais com o lado de dentro.
Ir devagar. Chegar, se assim desejar.
Ignorar, desligar, respirar.
Quero mais paz.
Mais simplicidade.
Água de côco, agenda vazia, abraçar o dia.
Quero mais saúde, mais liberdade, mais praia.
Mais amor, menos vaidade, mais cor.
Quero saber menos e viver mais.
Saber na superfície é quase o mesmo que não saber.
Quero um pouco mais. 

Ou talvez, quer saber,
acho que quero é menos. 

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Olhares que alcançam o mundo




Sabem-se pequenos em estatura, mas grandes em alcance.

Os olhares atentos de cada um naquela noite alcançavam o mundo inteiro, dentro daquele pátio cheio de verde,
Infestado de cor.

Gente que sabe ver gente. Que tem talento, mas também pequenez. 

Que tem garra e ambição, mas vê o outro como a si mesmo. Às vezes mesmo antes de si mesmo.

Gente que desde criancinha aprendeu a amar como se deve... Livremente, sem julgamentos, sem preço a pagar, sem rótulos.

Gente tão bonita pra esse mundo. Fresquinhos, novos em folha, e ao mesmo tempo tão maduros, tão prontos.

A verdade é que dá um frio aqui dentro, um medo de o mundo estragar, machucar, destruir o que é bom.

E logo depois do medo, a certeza: o que é deles, nada no mundo tira. Corações ardentes, e ao mesmo tempo puros.
Sonhos tantos, e todas as ferramentas para segui-los. Já sabem quem são, já se reconhecem, já aparecem.

O que vemos, são apenas 15 anos. Mas na alma, incontáveis idades.

Agora, são cada um, são folhas separadas.

Mas dentro, se unem em árvore.

Pra sempre,  serão Ágora.

domingo, 12 de agosto de 2012

Meu pai não é herói de filme americano



Meu pai não é herói de filme americano. Mas perdi as contas de quantas baratas ele matou por mim, mesmo que fosse no meio da madrugada e ele tivesse que acordar para a perseguição. Ele não é o mais forte de todos, o mais machão, o mais seguro. Mas sempre me mostrou seu lado humano, o que nos permitiu uma proximidade invejável desde cedo. Ele também nunca foi o mais alto, mas nos ombros dele eu me sentia a maior das criaturinhas. Meu pai saia pra padaria e voltava com diversas revistinhas da turma da Mônica pra mim. Eu tinha vontade de comer um doce, ele ia antes que eu acordasse comprar morangos e a gente misturava leite condensado e comia juntos no quarto dele, assistindo aos meus desenhos de menina.  Ele me levava pra piscina, e eu gostava de pisar nas pernas dele pra me sentir mais segura na parte funda. Ele me deixava fazer quase tudo que eu quisesse, e lembro a primeira vez que brigou comigo, quando resolvi sair do nosso condomínio pro de uma amiga, há menos de duzentos metros, de bicicleta sem avisar. Os olhos dele pra mim eram de raiva, mas também de medo, e aquilo acabou comigo. 

Um dia meu pai me deixou dormir às 11h da noite, e eu achei aquilo o máximo! Meu pai sempre me encheu de palavras de admiração, sempre levou a sério o que eu sentia, e até hoje me fala do quanto acredita que as mulheres são muito mais evoluídas que os homens, rs. De fato ele sempre foi um grande feminista.

Os anos foram passando, e por causa dele realizei meu grande sonho do intercâmbio, onde conheci o amor da minha vida... Há quase um ano, ele me levou no altar até esse amor, e o recebeu no coração, sabendo o quanto ele me faz feliz.

Meu pai não é um herói americano. Mas no meu coração, ele é o herói que me ensinou que a vida é complicada, mas nas coisas simples, na fotografia, nos livros, nas viagens e especialmente na conversa, dividimos pra somar. E o colo dele me trouxe muita paz. Meu pai não é herói, nem americano.
Meu pai é o melhor que ele pode ser pra mim. Ele é pai por inteiro.  

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Na estrada





A folha em branco. Os olhos diante na máquina de escrever. Nenhuma letra sequer. Nada.

A estrada vazia. Dentro do carro, seguindo pelos quilômetros sem fim, uma reta única, árida, vaga. No meio do nada.

Ambas incertas. Firmes, porém perdidas, sem limite. Até onde irá a estrada? Onde se vê a próxima curva? Como se inicia o texto, como construí-lo, bordá-lo, nitri-lo, como? Por onde começar? 
As letras, antes de unidas em palavras, e então frases, são apenas letras. Sozinhas. Separadas. Sem sentido.

Uma estrada vazia. Uma folha em branco. Que será mais angustiante que isso?

Um coração que anda em linha reta, sem nada encontrar, vendo sempre a mesma paisagem. Ou que, na tentativa de criar laços, vê letras, mas não consegue reunir frases. Talvez seja ele sim, o mais vazio de todos.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Pés descalços


Pés descalços, sorriso estampado na cara. Mais uma manhã na vida da menina de 10 anos. De férias. Na casa do pai.
Ela era uma estampa de preguiça boa com energia, aquele misto de vontade com calmaria. Coisa de criança.
O café da manhã farto, as brincadeiras com a vizinha, os mimos da "mãe preta". Batata frita no almoço, que Elza cortava bem fininha, imagina uma batata palha feita na hora, crocante, fresquinha. "Melhor batata frita do mundo", ela dizia.
Brincava no jardim, banho de mangueira, bicicleta no condomínio, aniversário de boneca. Com bolo e tudo.
À noite, miojo com galinha, que a amiga da escola comeu pela primeira vez na vida. E repetiu. Algumas vezes.
Som de desenhos animados pela manhã, na cama do pai. E de noite, filme infantil, deitada no peito dele. E aquele cheiro do desodorante que ele nunca mudou.
Ela sabia, sentia que eram dias que não voltariam. E os vivia na mais intensa entrega, ingenuamente aceitando-os como o "pra sempre" dela, ainda que passassem. Sempre passavam. Mas eram só dela, aquelas horas, que viraram dias, semanas, meses... e então, anos.  Tão contraditório e tão certo. Coisas do tempo.
Mas aqueles dias, sempre na memória, a fonte do brincar, saborear. Mastigar cada pedaço, com graça, curtindo, sem engolir inteiro nunca. E era assim tão fácil!
O segredo é lembrar, sempre que possível, dessas "coisas de criança". Só perde quem não quer encontrar.
Mas aquela batata frita... a melhor do mundo! Nunca mais iria provar.